quinta-feira, 1 de outubro de 2009


Um Ensaio Sobre O Suicídio.

O que os expectadores que assistem e chamam de loucura vai o aviso: pelo suicida é entendido como Solução.

21 de setembro. O dia Mundial de Prevenção do Suicídio. Iniciado em 2003, por iniciativa da Associação Internacional de Prevenção do Suicídio (IASP) e apoiada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) esta comemoração visa anualmente melhorar o esclarecimento acerca do suicídio através da disseminação de informação, diminuição do estigma e, sobretudo, difundir a idéia de que o suicídio é prevenível.
O tema de 2009 é a prevenção do suicídio em diferentes culturas.

Um assunto tão Polêmico. Tão Velado. Seria ele inerente a condição humana? Seria Normal? O que sabemos sobre o Suicídio? Sobre o Parasuícidio? Sobre o Homicídio-Suicídio? Seria os pensamentos suicidas algo tão distante de nós? Por que nos assustamos ou evitamos falar neste tema? Porque a morte de si por si próprio acontece?
Perguntas que não sabemos responder tão facilmente sobre um ato que abrevia a vida.
Por que os suicídios acontecem em sua maioria aos domingos? Quais os mitos sobre o suicídio?
“Segundo Marcimedes M. da Silva (Mestre em Psicologia Social) seria difícil precisar quando o primeiro suicídio ocorreu. Segundo o autor ele parece estar sempre presente na história da humanidade. A Enciclopédia Delta de História Geral registra que, em um ritual no ano 2.500 a.C., na cidade de Ur, doze pessoas beberam uma bebida envenenada e se deitaram para esperar a morte. Recorrendo a livros religiosos como a Bíblia, por exemplo, é possível também encontrar os registros de alguns suicidados famosos - Sansão, Abimelec, Rei Saul, Eleazar e Judas.O suicídio de pessoas famosas foi sendo registrado, porém a história oficial ignorou os inúmeros cidadãos comuns suicidados. No entanto, historicamente, é possível constatar a maneira como a sociedade tratou os suicidados e como este tratamento foi se alternando, cabendo observar, com especial atenção, o suicídio enquanto questão política tratada de diferentes maneiras pelo Estado”.
“Na Antiga Grécia, um indivíduo não podia se matar sem prévio consenso da comunidade porque o suicídio constituía um atentado contra a estrutura comunitária. O suicídio era condenado politicamente ou juridicamente. Eram recusadas as honras de sepultura regular ao suicidado clandestino e a mão do cadáver era amputada e enterrada a parte. Por sua vez, o Estado tinha poder para vetar ou autorizar um suicídio bem como induzi-lo. Por exemplo, em 399 a.C., Sócrates foi obrigado a se envenenar.”:


O estudo de Durkheim(1987), analisando os suicídios ocorridos no século passado, tornou-se obra clássica da sociologia por chamar a atenção sobre a significação social do suicídio pessoal - o suicídio é uma denúncia individual de uma crise coletiva. Já o estudo de Kalina e Kovadloff merece destaque porque parte da premissa de que em cada sujeito que se mata fracassa uma proposta comunitária. Eles analisam a sociedade atual com clara intenção de entender o suicídio como existência tóxica. A existência tóxica é a vida vivida de forma que o ser humano esteja se matando no cotidiano, todos se matando em comum acordo através de uma maneira de viver perigosa para a saúde. Uma existência tóxica é uma vida envenenada porque vive daquilo que a aniquila, promove e perpetua a alienação humana e fomenta o apoio às contradições que a destrõem. Para tanto, multiplicam-se as condutas autodestrutivas como o armamento nuclear, a contaminação do planeta e, até mesmo, a despersonificação urbana do homem contemporâneo. Enquanto na concepção clássica o suicídio é o ponto final de um processo, Kalina e Kovadloff(1983) afirmam que o suicídio é o processo em si mesmo.Partindo do pressuposto que o suicídio é um processo em si mesmo que não termina com a morte e, ainda, que o suicídio é um gesto de comunicação entende-se que o indivíduo se mata para relacionar-se com os outros e não para ficar só ou desaparecer. A morte é o único meio que o sujeito encontra para restabelecer o elo de comunicação com os outros. Continua o Autor : Fernando Sabino(1986), na crônica intitulada "Suíte Ovalliana", conta que Jayme Ovalle, questionado a respeito do suicídio, disse: "É um ato de publicidade: a publicidade do desespero."(p. 144) Desde dezembro de 1990, a publicidade do desespero dos índios guaranis de 16 a 22 anos, em Mato Grosso do Sul, ocupa as páginas dos jornais brasileiros, obrigando as autoridades governamentais a se interessarem por esta crescente onda de suicídios por enforcamento e por ingestão de veneno. A questão a ser discutida é: não é o suicídio um gesto de comunicação, a transmissão de uma mensagem individual para a sociedade? A resposta violenta do suicidado é sua busca em comunicar-se, transformando-se, porque a sociedade não lhe permitiu antes que o fizesse. Quando lhe foi impossibilitado comunicar-se, cortaram-lhe também sua influência sobre a sociedade, a qual se restabelece através de seu gesto suicida, mesmo que não seja uma pessoa famosa.
Note-se que o termo "suicida" não clarifica qual é a condição do indivíduo. Por isto, é preciso fazer uma distinção entre os termos "suicidando" - aquele que ameaça e/ou tenta suicídio e que pode ser chamado de ameaçador ou tentador; e "suicidado" - aquele que efetivamente se matou.

“ O suicidado pratica um ato de comunicação e não um gesto solitário e que, além de tudo, é uma comunicação para uma sociedade que o impede de comunicar-se de outras formas que não seja através deste gesto.”


Contrariando os mitos:
1. A cada 10 pessoas que cometem suicídio, oito avisaram família/amigos/parentes.
2. A maioria dos suicidas está indecisa sobre viver ou morrer e, frequentemente, "brincam com a morte". Confiando que outras pessoas vão salva-lo. Raríssimas vezes pessoas cometem suicídio sem avisar amigos e parentes.
3. A vontade de se matar passa. O indivíduo, com tratamento adequado, pode voltara ter uma vida normal
4. A maioria dos suicídios ocorre quando o indivíduo começa a melhorar. Menos deprimido e com mais energia, o suicida consegue dar vazão aos seus pensamentos e sentimentos mais mórbidos.
5. A morte por suicídio geralmente acontece depois de 5 ou 6 tentativas mal sucedidas.

Fato importante esclarecer: ter pensamentos suicidas não implica ser-se “louco”, nem necessariamente ser doente mental. As pessoas que tentam o suicídio estão seriamente afligidas e deprimidas. Esta depressão pode ser reativa, situação que é perfeitamente normal em circunstâncias difíceis, ou pode ser uma depressão endógena que é o resultado de um estado emocional diagnosticável com outras causas subjacentes. Também pode ser uma combinação das duas.
A questão da doença mental é difícil porque ambos os tipos de depressão podem ter sintomas e efeitos semelhantes. Além do mais, a definição exata de depressão como doença mental diagnosticável (ex. depressão clínica) tende a ter diferentes matizes, assim o fato da pessoa que se sente afligida o suficiente para tentar o suicídio ser diagnosticada como sofrendo de depressão clínica pode variar de pessoa para pessoa e entre culturas.
É provavelmente mais útil distinguir entre estes dois tipos de depressão e tratá-los adequadamente do que tentar diagnosticar a depressão como forma de doença mental, mesmo que os sintomas apresentados pela depressão reativa correspondam aos critérios da depressão clínica. Por exemplo, Appleby e Condonis escreveram:
"Pensamentos e atos suicidas podem ser o resultado de tensões e perdas com as quais não se consegue lidar.”

Numa sociedade onde o estigma e ignorância acerca da doença mental é significativo, a pessoa que experimenta comportamentos suicidários pode temer que os outros a considerem "louca" se revelarem os seus sentimentos, tornando-se relutantes em pedir ajuda durante a crise que atravessam. De qualquer forma, descrever alguém como "louco", com fortes conotações negativas, não é, provavelmente, útil e o mais provável é dissuadir alguém de procurar ajuda o que se pode revelar bastante benéfico, independentemente de ser diagnosticada doença mental ou não.

As pessoas que sofrem de uma doença mental tal como a esquizofrenia ou depressão clínica têm índices significativamente mais altos de suicídio, embora sejam ainda uma minoria dos que tentam tal ato. Para estas pessoas, ter a sua doença corretamente diagnosticada, com um tratamento apropriado, pode ser uma forma de impedir o ato de suicídio. "

Um pouco sobre estatísticas
Taxas de suicídio por 100.000 habitantes - Europa + outros países, ano mais recente disponível, ordenação decrescente
País Global Masculino Feminino
Lituânia 42.1 74.3 13.9
Rússia 38.7 69.3 11.9
Bielorússia 35.1 63.3 10.3
Eslovénia 28.1 45.0 12.0
Hungria 27.7 44.9 12.0
Estónia 27.3 47.7 9.8
Ucrânia 26.1 46.7 8.4
Letónia 26.0 45.0 9.7
Japão 23.8 35.2 12.8
Bélgica 21.1 31.2 11.4
Finlândia 20.6 31.9 9.8
Croácia 19.5 31.4 8.4
Suíça 18.4 26.5 10.6
Áustria 17.9 27.1 9.3
França 17.6 26.6 9.1
Moldávia 17.2 30.6 4.8
República Checa 16.9 27.5 6.8
Polónia 15.5 26.6 5.0
Roménia 14.1 23.9 4.7
Bulgária 14.0 21.0 7.3
Dinamarca 13.6 20.2 7.2
Alemanha 13.5 20.4 7.0
Suécia 13.4 18.9 8.1
Eslováquia 13.3 23.6 3.6
Irlanda 12.7 21.4 4.1
Austrália 12.7 20.1 5.3
Islândia 12.6 19.6 5.6
Nova Zelândia 11.9 19.8 4.2
Canadá 11.9 18.7 5.2
Luxemburgo 10.9 18.5 3.5
Noruega 10.9 16.1 5.8
Índia 10.7 12.2 9.1
EUA 10.7 17.6 4.1
Holanda 9.2 12.7 5.9
Itália 7.1 11.1 3.3
Reino Unido 6.9 10.8 3.1
Israel 6.3 9.9 2.7
Brasil 4.1 6.6 1.8
Albânia 4.0 4.7 3.3
Grécia 2.9 4.7 1.2
Geórgia 2.2 3.4 1.1
Arménia 1.8 3.2 0.5
Azerbeijão 1.1 1.8 0.5




Fonte: "Hearing the cry: Suicide Prevention", Appleby e Condonis, 1990. (ISBN 0-646-02395-0)

Como lidar com “um possível Suicídio”? Orienta-se que não se deve tentar resolver a situação sozinho; que se fale direto, abertamente sobre o suicídio; Importante que se esteja disposto ouvir a permitir a expressão de sentimentos com paciência.Um outro fato muito importante é não julgar se o suicídio é certo ou errado ou se os sentimentos da pessoa são bons ou ruins; evite sermão sobre os valores da vida, a importância da família, etc; Alguns Especialistas recomendam outras posturas:

Esteja disponível, demonstre interesse e compreensão.Não duvide que ele/ela se suicide; Não aja como se estivesse chocado;Tome uma atitude, remova da casa remédios, álcool, drogas, cordas, fios, facas e armas; Busque ajuda: Seja enfático ao encorajar a pessoa a buscar um profissional da área de saúde mental.Cabe Lembrar segundo estudo do FDA 80% dos americanos que se suicidaram em 2008 usavam somente antidepressivos.

domingo, 2 de agosto de 2009

O analista de Passo Fundo. Contribuições Lacanianas.


O Lacaniano de Passo Fundo

O psicanalista Mário Corso entrevista, para o Cultura,(Caderno de Cultura, Zero Hora, Porto Alegre) o Dr. Taurino Netto, conhecido como o lacaniano de Passo Fundo, patrão e fundador do Centro de Tradições Psicanalíticas Gaúchas – Proseando nos pelego É um contraponto ao Analista de Bagé, do Luiz Fernando Veríssimo.

Mário Corso: O Sr foi analisado pelo Analista de Bagé, como discípulo dele, considera que a teoria do joelhaço segue válida?
Taurino Netto: O joelhaço é a grande contribuição psicanalítica que o Rio Grande deu ao mundo, infelizmente ainda não foi reconhecida. Apenas tenho um senão com o Dr. de Bagé a respeito do croque. Não creio que se deva dar croque em paciente, isso puxa o lado criança dele, infantiliza o vivente. Temos que tratá-lo como gente grande, caso precisar dum corretivo o padrão é sentá o rebenque, coisa de adulto para adulto.
Mário Corso: Ainda que mal lhe pergunte, não tem muito gaúcho que acha que análise é frescura?
Taurino Netto: Todo mundo pensa assim até que a vida te chama na chincha, aí coisa é diferente. Quando, por exemplo, a prenda foi embora, ou um ente querido vai pros pagos do Patrão-Grande, ou ainda um filho saiu chambão e maconheiro. Nessas horas em que o vivente se sente esquilado pelo destino, ele afroxa o garrão e vem aprumá as idéias nos pelego do analista. Até por que, não tem por que um bagual ficar macambúzio e sentindo um minuano gelado na alma assim, sem serventia.
Mário Corso: Existem novas formas de neurose nos tempos atuais?
Taurino Netto: Foi bom me perguntar, até desenvolvi um conceito para isso, é a "Síndrome de Guaxismo". Tu sabes que guaxo é o que nasce pelos cantos sem ninguém cuidar, ou bicho que teve mãe postiça. Pois bem, o gaúcho foi pra cidade e se perdeu do chão da querência. Como não cultiva as coisas da terra, se sente sem raiz, sem pai nem mãe. Sente que ninguém cuida dele e que já não pertence a nada. Enfim, vai ficando mais perdido que cusco em tiroteio, e se não se cuida, tu sabes, de haragano prá boletero é uma orelha. Depois disso só maneando e chá de vara de marmelo.
Mário Corso: E antes que isso aconteça?
Taurino Netto: Pra prevenir é bom chimarrão, arroz de carreteiro, escutar uns discos do Noel Guarani e andar a cavalo. Feito isso, tá pelada a coruja.
Mário Corso: O que o Sr. acha dos recentes avanços na medicação?
Taurino Netto: Pois olha, eu ainda sô mais dos chás. Esses dias mesmo curei uma guria com carqueja. Veio pras consultas reclamar do mundo, do marido, dos pais, tudo era ruim. Pois pedi que cada dia tomasse três xícaras de chá de carqueja bem forte, uma ao acordar, depois pela tarde e a última pela noite. Passou um mês e ela ali só sapateando no meu saco, falando de tudo de ruim que os outros eram. Até que um dia ela diz que o chá não estava dando resultado, ela estava igual e que o chá era flor de ruim. E eu lhe disse que o chá não era para ela melhorar. E ela me pergunta: - pra que é então? Isso é prá tu ver como tu é com os outros, guria! Ela me responde: - eu sou como chá de carqueja? Pior, lhe digo, ao menos carqueja faz bem pros rins. Saiu batendo a porta, e mais sem graça que trote de vaca, mas nas sessões seguintes já estava mais pra chá de macela.
Mário Corso: Quem lhe parece que necessita de análise?
Taurino Netto: A neurose é quando o índio se atrapalha sozinho, quando não precisa de inimigo. Tu sabes que têm uns cuera que se enroscam as boleadeiras nas próprias pernas e a vida não vai pra frente nem pra trás. Pois os psicanalistas estão aqui pra desinliá o vivente, para que ele possa retomar as rédeas do seu destino. Demora um pouco por que neurose é coisa mais embretada que rato em guampa, e o analista tem que ter mais paciência que tropeiro de lesma.
Mário Corso: O Sr. tem outra teoria em desenvolvimento?
Taurino Netto: Estou trabalhando na definição da "Personalidade Carrapato" é o que mais tem hoje em dia. Sabe esses tipo que não conseguem ficar sozinhos, que não fazem nada, mas nada mesmo da vida, só enche a paciência dos em volta. Por isso é a "Personalidade Carrapato", vive do sangue e da vida dos outros, parece que veio para vida a passeio. E também ando lidando no aperfeiçoamento de um conceito: quem é mais vaqueano em psicanálise sabe que embora o joelhaço seja a contribuição mais conhecida, ela é técnica, e não se compara à contribuição teórica que o Analista de Bagé nos deu com a descoberta da Noemi, a porção feminina que todo gaúcho carrega naquele espaço espremido entre o ego e o id, nos fundos do superego. Cá entre nós, ele tem razão, mas acho que deveria se chamar porção Creuza. Pois bem, tenho tentado aperfeiçoar esse conceito e explicar todos os porquê da Creuza. Em outras palavras, como é que cada gaúcho segura a rédea firme e curta pra manter sua Creuza num andar seguro, pois se largar é ela que encilha o vivente.
È como eu sempre digo: mulher sardenta, cavalo passarinheiro e uma Creuza sem freio, alerta companheiro!
Mário Corso: E como é que o Sr. lida com a sua parte Creuza?
Taurino Netto: Tu sabe por que é que todo gaúcho anda de faca na cintura? É pra usa quando uns boi corneta insistem numas perguntas que não lhe dizem respeito. O cuidado de cada Creuza é assunto particular de cada gaúcho. Mas vou te dar uma opinião geral: na minha opinião manieta no tranco, é que vira o fio e faz a vaca ir pro brejo. O certo é aprender a conviver, na maioria das vezes é coisa pequena, não mais que um brinco na orelha. Muitas vezes é aqui entra o analista, pra apartá a peleia da Creuza com o resto do ego do vivente. E não é só ela, eu sustento que existe a porção Pedrão dentro de qualquer prenda. Pode ser a mais "sim senhor" e "com licença" das prenda e ela tem um Pedrão, que se não for domado, põe no cabresto o homem mais perto. Isso se o Pedrão dela já não tomou conta e se bandeou pros lado de ser Pedrão de outra prenda.
Mário Corso: Já que estamos no tema, como que o Sr. vê essa polêmica recente sobre se gaúcho de brinco pode ou não entrar em CTG?
Taurino Netto: Pessoalmente nunca usei, não uso e não usarei, se me virem de brinco pode me internar por que estou em surto psicótico. Agora, quanto aos outros, por mim tudo bem, é a sua porção Creuza se manifestando. Se quiserem podem até se vestir de prenda, mas tem uma coisa, depois não me vem reclamar...
E tem mais um porém, como eu só tenho uma dúvida no vestir, se é dia de bota ou de alpergatas, posso dizer: não é a pilcha que faz o gaúcho, senão qualquer mequetrefe poderia ser. O gaúcho é como uma faca, vale pelo fio, não pela bainha.
Mário Corso: Então lhe parece que o gaúcho tem um algo a mais, uma essência?
Taurino Netto: E como que não! Como Freud já dizia: Ein Gaucho zu sein ist eine Weltanschauung. (Ser um gaúcho é uma "pampavisão"). Olha esse mundo em reboldosa em que vivemos, e me diz se o alemão de Viena não tinha razão. É só entrevero e estrupício por todos lados. Nosso gaúcho é o único que não caiu do cavalo. Eu é que não saio do Passo Fundo.
Mário Corso: A que o Sr. atribui essa força do gaúcho?
Taurino Netto: Pois veja, penso que o gaúcho é um peleador também por causa do chimarrão. O mate é como a vida, é amargo mas a gente vai se acostumando até que fica bom e ainda clareia as idéia e as urina. Aliás, uma análise também é assim, o vivente tem que passar pelo momento amargo pra voltar a achar a vida doce. A vida é dura, como diz nosso filósofo passofundense Ernildo Pedroso: "o ser é uma faca sem cabo em que se perdeu a lâmina". Ou seja, no fundo somos coisica de nada, nosso destino é campear um sentido nesse grande pampa sem porteira e varrido pelo vento que é a vida.
Mário Corso: E porque o Sr. se chama de lacaniano?
Taurino Netto: Até que prum francês esse tal de Lacan sabia onde moravam as corujas. Vai muito do jeito, um analista sabe quando o outro é guapo e não se micha pra pega louco pelas guampa. E tem mais, pois não é que ele diz que: a mulher não existe. É o que eu sempre insisti, o que existe é a prenda.
Mário Corso: O que o senhor votou no plebiscito do desarmamento?
Taurino Netto: Votei pelo Sim. Gaúcho resolve as coisas na palavra. Apenas, se a coisa preteia é que se apela pro facão. Penso que revolver é coisa pra se apontar só contra castelhano.
Mário Corso: Dr. Taurino, para encerrar, uma pergunta já no estribo, como é que fica o gaúcho frente à globalização?
Taurino Netto: Cada dia melhor, é bom para nós, ou como é que de outro jeito vamos levar os ideais do Rio Grande mundo afora. Como o mundo vai nos tomar como modelo se não nos conhece? Nós já temos CTG no Japão, só vamos parar quando já tiver CTG de esquimó.
Publicado no Jornal Zero Hora, Caderno de Cultura, em 14 de janeiro de 2006.

sexta-feira, 10 de julho de 2009





AS CRIANÇAS E AS MEDICAÇÕES:
RITALINA OU RITA LEE?

Não trazemos aqui nenhuma novidade ao falar que cada vez mais que professores, orientadores pedagógicos e pais têm “aceitado” que as crianças que demonstram comportamento agitado, desatento devem receber alguma medicação psiquiátrica para “normatizar” este comportamento. Problemas como estes se apresentam de maneira muito comum, tanto a agitação das crianças como o imediatismo da não-reflexão sobre o sintoma ou dessa manifestação infantil e a suposta urgente medicação. Mas especificamente falamos daquilo que com o surgimento do DSM-III e classificou-se como TDAH, o chamado Transtorno do Déficit de Atenção por Hiperatividade. De maneira crítica o Psiquiatra Durval M. Nogueira Filho² pontua que as manifestações infantis, são hoje, perigosamente defendidas pela literatura biologiscista “A visão biologiscista, segundo a qual o usuário desse sistema é descaracterizado do seu contexto histórico, social e cultural, não tem respondido às reais necessidades para suas condições de vida e saúde” Trata-se este tipo de sintomatologia, além de uma grande dramatização, com o imediato uso de metilfenidato ( uma metanfetamina comumente e comercialmente conhecida como Ritalina) como se falássemos de função cerebral defeituosa. Dentro deste paradigma (ou sintoma social?) cegam-se as reais possibilidades e necessidades de entender, escutar um “Hiperativo” negando a ele uma condição mais humana saudável, contextualizado este indivíduo dentro de seu contexto histórico, social e familiar para apenas torná-lo um dependente químico e abortar suas possibilidades pela tarja diagnóstica que há de se levar para toda sua vida.
Segundo Steven Rose, neurocientista questiona de sua insuspeitada condição se esta seria mesmo, uma abordagem médico-psiquiátrica adequada a uma condição inequivocadamente patológica ou se ela seria um mero paliativo, com o objetivo de evitar algumas questões ou personagens deste conto “hiperativo”: A escola e seus desdobramentos e problemáticas; os pais e o contexto histórico social.
Fica claro a partir de um questionamento de um neurologista que há uma denúncia: estaria havendo um deslocamento de responsabilidades, da estrutura familiar, social e escolar, desvelando a possibilidade da falha da família e da escola que se ocultam por trás do cérebro “defeituoso”.
O intuito aqui não é encerrar a bioquímica ou conclamar um tribunal de júri, mas antes disso, e, bem menos isso conclamar os “imediatos” a uma reflexão que não se finda de uma maneira tão prática e ineficaz. Há por trás disso uma condição uma humana, possibilidades desta condição, capacidade de criação, a necessidade da reflexão a lembrança da liberdade e de suas expressões humanas, e indo uma pouco adiante, a vida humana com suas tristezas e alegrias não se sustenta somente em uma concepção biológica somente.
Mesmo apesar de todos alertas que são feitos esta “práxis-ritalina” (ver meu texto “medicalização” www.fabioulrich.com”) tem se tornado (um tornado) cada vez mais comum abortando e banalizando a condição humana.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Fotografia: Uma Janela da Alma.







Fotos: Evgen Bavcar - fotografo cego.

veja mais sobre fotografia no link abaixo.
http://www.youtube.com/watch?v=LVCM9DCK5Fs

segunda-feira, 27 de abril de 2009

A ALMA SERIA UMA COISA?




Nesta situação, neste contexto histórico social, não surpreende que a psicanálise seja paulatinamente violentada pelo discurso tecnicista alegando sua ineficácia. Ineficácia?
Fraçoise Giroud declarou “A análise é árdua e faz sofrer. Mas quando a imagem que se tem de sim mesmo se está desmoronando sob o peso das palavras recalcadas, das condutas obrigatórias, das aparências a serem salvas, quando a imagem que se tem de si mesmo torna-se insuportável, o remédio é esse, guardo por Lacan uma gratidão infinita(..) não mais sentir vergonha de si mesmo é a realização de liberdade.Isso é o que uma psicanálise bem sucedida ou bem conduzida ensina aos que lhe pedem socorro”.
Mas, por que a psicanálise suscitaria tanto opróbrio?
A Psicanálise parece ser ainda mais atacada hoje em dia por haver conquistado o mundo através da singularidade de uma experiência subjetiva que coloca o inconsciente, a morte e a sexualidade no cerne da alma humana.
Acredito que a significação deste equivocado descrédito deva ser buscada na recente transformação dos modelos de pensamentos desenvolvidos pela psiquiatria dinâmica, nos quais repousa, há dois séculos, a apreensão do status da loucura e das doenças psíquicas nas sociedades ocidentais.
Esclarecendo, chama-se psiquiatria dinâmica os conjunto das correntes e escolas que associam uma descrição de doenças da alma (loucura) dos nervos (neurose) e do humor (melancolia) a uma tratamento psíquico de natureza dinâmica, melhor dizendo, que faça intervir uma relação transferencial entre o médico e o doente. Oriunda da medicina,a psiquiatria dinâmica privilegia a psicogênese (causalidade psíquica) em relação a organogênese (causalidade orgânica), mas no entanto sem excluir esta última, apoiando-se em quatro grande modelos de explicação da psique humana: um modelo nosográfico nascido da psiquiatria, que permite ao mesmo tempo uma classificação universal das doenças e uma classificação universal das doenças e uma definição da clínica em termos de norma e patologia um modelo terapêutico herdado dos antigos curandeiros que presume a eficácia terapêutica a um poder de sugestão.
No entanto, diante do impulso da psicofarmacologia, a psiquiatria abandonou o modelo nosográfico em prol de uma classificação de comportamentos. Reduziu a psicoterapia a uma técnica de supressão de sintomas. Percebemos então a valorização empírica e ateórica dos tratamentos de emergência. O medicamento sempre atende, seja qual for a duração da receita, a uma situação de crise, a um estado sintomático. Quer se trate de angústia, agitação, melancolia ou uma simples ansiedade. É preciso, inicialmente tratar o traço invisível de sua doença para depois suprimi-la. As modalidades medicamentosas utilizadas como única terapêutica e pelo discurso fálico das “receitas” orientam o paciente para uma posição ainda mais conflituosa e consequentemente depressiva. Em lugar das paixões, a normopatia; em lugar do desejo, ausência; em lugar do sujeito, o nada, em lugar da história, o fim da história. “ O moderno profissional de saúde – psicólogo, enfermeiro psiquiatra ou médico já não tem tempo para se ocupar da longa duração do psiquismo, por que na sociedade liberal depressiva seu tempo é contado”

O MAL ESTAR NA CONTEMPORANEIDADE



Um Breve comentário.


“Deus está morto. Marx está Morto. E eu, para falar a verdade, não me sinto muito bem"
(Woddy Allen)




Falemos um pouco então, daquilo que talvez, seja o mote central do contemporâneo: O Mal Estar.

O Mal Estar e o Mundo Contemporâneo.

Há um lugar para conceber que as pedras falam e que há a possibilidade de se entender o idioma inconversável delas . Mas para tanto há de ter poesis, há de ter criação. Freud quando apresenta as descobertas possibilitadas pelo emprego do método psicanalítico na observação e escuta dos sintomas histéricos, afirmou: "As Pedras Falam" . O produto da atividade neurótica, símbolos mnêmicos das atividades infantis recalcadas, são potencializados pôr uma linguagem que então, traduzida e decifrada, informa sobre experiências e acontecimentos do passado que testemunham sobre a origem da doença. A experiência psicanalítica que se funda no método da interpretação, que elucida os sentidos mais ocultos dos sintomas, configura-se como a "cura pela fala" que nos remete a pensar que tudo o que pensamos. Falamos e ao falar utilizamos uma linguagem que é composta de palavras, pois a “escrita é sempre a escrita de uma fala” [SAFOUAN]; o inconsciente se estrutura como uma linguagem solicitando como uma condição operacional, a inscrição de eventos no inconsciente, melhor dizendo, no registro das representações.

“Aonde não há poesis, pedras passam por pedras mesmo. O terreno, por conseguinte não é propicio à descoberta de objetos marcados por inscrições codificadas" (Lowenkron )

Dentro desta perspectiva, o terreno não seria propicio à descoberta de objetos marcados por inscrições e passíveis de tradução. Na verdade, a psicanálise, desde sempre facultou esta possibilidade, testemunhada na formação das "neuroses atuais". Falemos, então, de estados neuróticos desprovidos de atividade criadora, impossibilitados de realizar a passagem da intensidade pulsional para o registro da interpretação. Esclarecendo, das dificuldades encontradas pelo sujeito para a simbolização, melhor dizendo, para efetuar o processo de simbolização, surgem os sintomas que, supostamente, não são portadores de sentido. Seriam sintomas que não falam, mas explicitam perturbações de economia sexual somática. Tal economia exerceria um conhecimento não pensado, não inscrito no registro da representação. Neste processo, ocorrem manifestações que são sentidas, percebidas como um Mal-Estar que não encontra definição que, muitas vezes não se localiza. Um Mal Estar Indizível. Essas categorias clínicas demarcam fortes limites ã clínica psicanalítica, tal como se apresenta e se pensa fundamentalmente na clínica baseada do recalque.

As questões seriam: sobre quais diferenças estamos falando, quando e por que elas acontecem? Bion diz que talvez encontremos mais "Hamlets" do que "Édipos". Roudinesco afirma que "Os pacientes dos anos 90 são muito diferentes daqueles dos primeiros tempos" e continua a autora, que cada um de nós não cessa de confirmar na própria experiência.


Penso que as questões colocadas até agora, não são nenhuma novidade para quem nos ouve, neste momento, muito antes pelo contrário, também refletem e sentem o mal estar com o qual se deparam quotidianamente. Com tais questões e, concordam os psicanalistas, sejam quais forem suas premissas ou tradições de pensamento psicanalítico que, existem mudanças importantes na economia psíquica do homem contemporâneo.

Falando de sofrimento psíquico na atualidade, destacam-se os chamados transtornos depressivos, que se caracterizam por sentimento de um vazio interior, redução de auto-estima, falta de identidade, empobrecimento da experiência subjetiva e criativa, somatizações graves, as toxicomanias e os modos perversos de existência.


“As pessoas que vêm consultar-nos, começam geralmente por relatar uma depressão, maior ou menor, uma dificuldade de viver, uma incapacidade para fazer as coisas mais simples. Nas entrevistas, por vezes reconhecemos o que classicamente conota a depressão: abatimento, inibição do pensamento, sentimento de vazio, cansaço, apatia, impossibilidade de amar, impotência ou frigidez, sentimento de inferioridade, de inadaptação ou ausência de valor" CHEMAMA,R

Não se pretende, aqui, uma revisão teórica, mas sim, evidenciar uma coalizão de pensamentos psicanalíticos acerca do sofrimento psíquico que se apresenta no mundo contemporâneo, os desafios da clínica psicanalítica que, por sua vez tem seu setting redimensionado por sofrimentos e sujeitos que se manifestam sob a forma de sintomas narcísicos, depressivos, com dificuldade de articular narrativas, suas próprias histórias, suas experiências, amores e dores.
Além da marca deste discurso há uma solicitação imediata da remissão deste quadro, o alívio rápido, e a dificuldade de aceitar um trabalho sistemático e regular que a psicanálise solicita.

ROUDINESCO afirma que a depressão deveria ser pensada muito mais como um avatar do que propriamente como uma entidade autônoma. ROUDINESCO enfatiza que a histeria, evidentemente não desapareceu, no entanto ela está sendo cada vez mais tratada e vivida como uma depressão. O modo depressivo então, de sofrimento guarda conformidade com o que se chama de sociedade depressiva, na qual então, se instaura, e o paradigma da histeria é "substituído pelo da depressão" .

No entanto a categoria denominada como depressão (cabendo distingui-la da melancolia) atualmente ampara-se fortemente no discurso psiquiátrico e seus ideais fálicos, já evidenciados por MICHEL FOUCAULT em sua obra “A Micro-Física do Poder" que, por sua vez trabalha com um método empírico experimental, produzindo, conseqüentemente um campo fecundo de pesquisa para psicofarmacologia, para neurociências e outras disciplinas que operam num contexto de pensamento notoriamente não-neutro, tratando os transtornos depressivos como anomalias, mal funcionamento cerebral, cujo o comportamento possa vir a ser corrigido por meio de medicamentos, tornando dispensável a busca de sentido para os sintomas.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Tendência Antissocial


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A TENDÊNCIA ANTI-SOCIAL

Numa conferência proferida em 1956 para a Sociedade Britânica de Psicanálise, Winnicott escreveu;

“A tendência anti-social cria para a psicanálise alguns problemas espinhosos, problemas de natureza prática e teórica. Freud, através de sua introdução ao livro de Aichohorn, Wayward Youth, mostrou que a psicanálise não só contribui para a compreensão de delinqüência como é enriquecida por uma compreensão do trabalho daqueles que lidam com delinqüentes (...). Decidi discutir não a delinqüência, mas a tendência anti-social. A razão é que a defesa anti-social organizada está sobrecarregada de ganho secundário e reações sociais que tornam difícil ao investigador atingir seu amargo. Em contrapartida, a tendência anti-social pode ser estudada tal como se apresenta na criança normal ou quase normal, onde se relaciona com dificuldades inerentes ao desenvolvimento emocional.”
Apesar desta relação apontada por Freud, os distúrbios de caráter e a delinqüência não têm, a meu ver, por razões várias, recebendo da psicanálise toda a carga de conhecimento e de pesquisas que poderiam ser levantadas por este portentoso problema que preocupa hoje em dia a humanidade inteira. Assim sendo, os trabalhos de Winnicott a este respeito, embora escritos nas décadas de 40, 50 e 60, ainda conservam todo um frescor, oportunidade e sentido para os dias atuais. Continua ele;

“A tendência anti-social não é um diagnóstico. Não se compara diretamente com outros termos diagnósticos como neurose e psicose. A tendência anti-social pode ser encontrada num individuo normal ou num individuo neurótico ou psicótico.”

Para ele a tendência anti-social está sempre relacionada a uma privação importante no passado do individuo, muito embora essa privação – representada, por exemplo, pelo nascimento de um irmão ou por um episódio depressivo na vida da mãe – possa passar despercebida pelo meio ambiente. Em suas palavras;
“Uma criança sofre privação quando passam a faltar características essenciais da vida familiar. Torna-se manifesto um certo grau de privação.
O comportamento anti-social será manifesto no lar ou numa esfera mais ampla. Em virtude da tendência anti-social, a criança poderá finalmente ter que ser considerada desajustada e receber tratamento num alojamento para crianças desajustadas, ou pode ser levada aos tribunais como criança incontrolável. Agora, delinqüente a criança pode tornar-se um individuo em liberdade condicional, sob mandado judicial ou ser enviada para um reformatório (...) Caso todas essas medidas fracassem, o jovem adulto será considerado um psicopata e remetido pelos tribunais para um instituto correcional para jovens delinqüentes ou para uma prisão.”
Noutro trecho, continua Winnicott;
“Existe uma relação direta entre a tendência anti-social e a privação (...) Deve-se a John Bowlby o fato de haver hoje um relacionamento generalizado das relações entre a tendência anti-social e a privação emocional, tipicamente no período que vai até a idade em que a criança começa a dar os primeiros passos, entre um e dois anos de idade (...) Quando existe uma tendência anti-social, houve um verdadeiro desapossamento (não uma simples carência); quer dizer, houve perda de algo bom que foi positivo na experiência da criança até uma certa data e que foi retirado; a retirada estendeu-se por período maior do que aquele em que a criança pode manter viva a lembrança da experiência.”
Numa das suas visões clínicas mais simples e integradoras sobre este problema ele adverte que;
“Existem sempre duas direções da tendência anti-social, embora às vezes uma seja mais acentuada do que a outra. Uma direção é representada tipicamente pelo roubo e a outra pela destrutividade. Numa direção a criança procura alguma coisa, em algum lugar, quando tem esperança. Na outra a criança está procurando aquele montante de estabilidade ambiental que suporte a tensão resultante do comportamento impulsivo. É a busca de um suprimento ambiental que se perdeu , uma atitude humana, que uma vez que se possa confiar nela , dê a liberdade ao indivíduo de se movimentar, agir e excitar. É sobretudo por causa da segunda tendência que a criança provoca tendências ambientais totais, como buscando moldura cada vez mais ampla , um círculo que teve como seu primeiro exemplo os braços da mãe ou o corpo da mãe. È possível discernir uma série : o corpo da mãe , os braços da mãe, a relação parental, o lar, a família, a escola, o país com suas leis”
Sobre o Roubo ele escreve:
“O furto está no centro da tendência anti-social, associado a mentira. A criança que furta um objeto não está desejando o objeto furtado, mas a mãe sobre quem ela tem direitos. Será possível unir as duas tendências, o furto a destruição, a busca do objeto e aquilo que a provoca, as compulsões libidinosas e agressivas? Na minha opinião, união das duas tendências está na criança e representa uma tendência para uma autocura, cura de uma dissociação de instintos. Quando há na época, na privação original, alguma razão de fusão de raízes agressivas(ou motilidade) com raízes libidinais, a criança reclama a mãe por uma combinação de furto, agressividade e sujeira, de acordo com detalhes específicos do estado de desenvolvimento emocional dessa criança. Quando existe menos fusão, a busca do objeto e agressão estão mais separadas uma da outra e há uma maior grau de dissociação da criança. Isso leva à proposição de que o valor de incômodo da criança anti-social é uma característica essencial, e também é, sob o aspecto positivo, uma característica favorável, que indica uma potencialidade de recuperação da fusão perdida dos impulsos libidinais e motilidade”
Sobre o valor do incômodo do bebê em relação à mãe, Winnicott está referindo a “amolação” que uma criança impõe à mãe através de uma enurese noturna ou as expensas de um comportamento de bagunça, de um dirigir-se constantemente à mãe para incomodá-la e para receber uma resposta qualquer desta. Por este motivo para ele qualquer exagero do valor do incômodo de um bebê pode indicar a existência de certo grau de privação anti-social. A manifestação da tendência anti-social inclui roubo, mentira, incontinência e modo geral, uma conduta desordenada, caótica. A partir deste estudo da tendência anti-social há sempre uma esperança. Enquanto existe um comportamento anti-social de provocação há esperança da criança de que o meio se recupere e lhe forneça a provisão ambiental que lhe é devida. Entretanto num bom número de casos, ou o ambiente não reconhece a privação e a falta e não se corrige, ou quando o faz, a criança a esta tentativa de cura ou de alguma. Este é um dos aspectos mais intrigantes e frustradores “do tratamento analítico destes pacientes eles reivindicam, de várias formas, um tipo de ajuda e quando lhe és oferecido e uma oportunidade de recuperação” (Mello 1989)
Winnicott sublinha o tempo todo que a terapia da privação original e da tendência anti-social em privação original e da tendência anti-social em estruturação é realizada pela própria mãe e pela família como um todo, ou numa instituição especializada. Neste casos na segunda intenção poderíamos acrescentar sobre a perda original Winnicott acrescentou que a perda original que há um ponto especial de deve-se sublinhar. Na base da tendência anti-social está uma boa experiência emocional que se perdeu. Sem dúvida é uma característica essencial que o bebê tenha atingido a capacidade que a causa do desastre reside numa falha ou omissão ambiental. O Estado de maturidade do Ego, possibilitando uma percepção desse tipo, determina o desenvolvimento de uam doença anti-social, em vez de uma doença psicótica.

Estados Depressivos




Estados Depressivos.

Sem sombra de dúvida, podemos afirmar que na atualidade, que os quadros clínicos de depressão vêm mostrando significativo crescimento na prática analítica. No entanto devemos ressaltar alguns fatos bem importantes sobre os tratamentos, tipos de estados depressivos e equívocos decorrentes de atendimentos precipitados. Para tal justificativa vou me amparar em dados estatísticos para balizar de maneira séria e honesta alguns dados que trago a seguir.
1.Entre as dez mais importantes doenças incapacitante de indivíduos, cinco são emocionais, dentre elas a depressão: é a primeira delas.
2. 50% (cerca de) de médicos não psiquiatras ou psicanalistas não diagnosticam ou se o fazem cometem equívocos importantes e prejudiciais usando benzodiazepínicos ou antidepressivos em dosagens erradas.
3.O números de estados depressivos está aumentando.
David Zimerman psiquiatra e psicanalista afirma: “virtualmente, em todos os quadros de patologia mental existe subjacente, alguma forma de estado depressivo”
4. É grande o número de “depressões subclínicas”, melhor dizendo estados depressivos que não se mostram ou se manifestam de forma evidente e sim por traços inaparentes, como por um estado de continuada apatia, ou vir a se revelar por hipocondria, alcoolismo, transtornos alimentares, etc. Segundo Zimerman podemos classificar:

Tipos:
a) Atípica: mais conhecida com os nomes de “depressão neurótica” ou “depressão reativa”. Seu perfil é único e resulta de alguma forma de crise existencial, por razões predominantemente internas ou externas. Habitualmente não respondem bem à medicação.
b) Endógena: resulta de causas orgânicas e manifesta-se com sintomatologia mais típica, adquirindo características “unipolares” (os sintomas são unicamente depressivos) ou “bipolares” (os sintomas tanto podem ser da esfera depressiva ou, em um pólo oposto, de natureza “maníaca”). Apesar de serem endógenas, comumente elas podem ser desencadeadas por fatores ambientais, se assemelhado qualitativamente à depressão atípica. Costuma responder bastante bem à moderna medicação antidepressiva, quando adequadamente ministrada e, principalmente, quando acompanhada de alguma forma de terapia de base analítica.
c) Distímica: esta denominação corresponde à depressão que comumente é de chamadas de “crônica”.

Principais Causas da Depressão
A) Depressão anaclítica: resulta de um primitivo “vazio de mãe”.
B) Identificação com o objeto perdido: corresponde ao clássico aforismo de Freud – “a sombra do objeto recai sobre o ego” - , com um luto mal-elaborado desse objeto, de maneira que propicia a instalação de quadros “melancólicos”.
d) Depressão por perdas; tanto de objetos importantes – especialmente quando foram perdas prematuras, traumáticas e significativas – como também de partes do ego, tal como acontece nas “depressões involutivas”, quando o sujeito que está entrando em idade mais avançada sente estar perdendo o vigor físico, a concentração, a memória, etc.
e) Depressão por culpas; neste caso, a depressão é determinada pela ação punitiva de um superego tirânico, aquilo que também chamamos de uma autocrítica punitiva.
f) Identificações patógenas: em especial aquelas que, particularmente, tenho proposto a denominação de “identificação com a vítima”.
g) Ruptura com os papéis designados: a depressão provém da ação de um “ego ideal” – que obriga o sujeito a corresponder os inalcançáveis ideais que o seu narcisismo original exige – bem como de um “ideal de Ego”, que resulta das expectativas grandiosas que os pais e o ambiente circundante depositaram no sujeito, desde bebezinho, atribuindo-lhe papéis que ele deverá executar pelo resto da vida, caso contrário, despertam nele uma sensação de traição, vergonha e humilhação.
h) Depressão decorrente do fracasso narcisista: Muito freqüente; estado decorrente de algum tipo de fracasso que o sujeito fortemente fixado naquilo que chamamos de “posição narcisista”, sofre diante de enormes demandas de obtenção de êxitos sucessivos, como dinheiro, poder, prestígio.
i) Pseudodepressões: Como no tipo de pessoa que atravessa uma vida inteira aparentando desvalia e pobreza que não correspondem a sua realidade. Comporta-se desta maneira por motivos como: medo de atrair a inveja retaliadora; medo de provocar tristeza naqueles que o invejarem; medo de se tornar a partir do olhar do outro uma fonte inesgotável de provimento e satisfação de necessidades; uma forma de parecer ser um sofredor, que para ele representaria um merecimento do amor do outro.

Sobre o tratamento:

Em todas as situações descritas e motivos de estados depressivos, cabe lembrar que não são necessariamente situações ou motivos estanques, rígidos, ou únicos. O sujeito pode apresentar motivos em algumas situações concomitantes. A Indicação para tanto é a psicoterapia e não cabe também discutir a eficácia dos antidepressivos. Mas chamamos a atenção para o uso indiscriminado e uso equivocado dos benzodiazepínicos, aquilo que chamamos de “medicalização” . Evidente que o uso de antidepressivos é importante e não exclui a psicoterapia. Consenso é em casos mais graves e importantes o uso combinado e adequado da psicoterapia e dos antidepressivos. Lembrando dados estatísticos do FDA dos Estados Unidos: entre 100 suicidas nos deste país, 80 usavam somente antidepressivos (dados de 2007).

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Barroco Hi-Tec


O Sujeito Fragmentado: Barroco Hi-Tec.


Se fizermos uma leitura da contemporaneidade, ou como preferem outros “a pós-modernidade” a partir da globalização neoliberal, vamos identificar como muita facilidade com a crise dos estados-nações, com seus enfraquecimentos de suas fronteiras, de distinções entre culturas, aliados a uma mobilidade econômica, geográfica e cultural. Somamos isso as características da natureza geral da guerra e da paz no final do século XX, como diz Bartucci (2006) “uma linha divisória que distingue os conflitos internos dos internacionais que desapareceu ou tende a desaparecer” e com isso reconhecermos no contemporâneo o “lugar da ausência das garantias”
Essa confirmação se é ratificada pelo discurso de nossos analisandos e profissionais em supervisão clínica que recebemos em nosso consultório. Ainda mais, os indivíduos que nascidos no pós-guerra, encontram-se produtivos demonstrando preocupações com seus filhos e netos. Os que se demonstram improdutivos tenta entender o que “deu errado” por meio de uma experiência da ressignificação da sua singularidade, ou subjetividade. .
Fato inquestionável: as novas gerações não têm expectativa de futuro. Participantes deste mundo globalizado, reféns das exigências da contemporaneidade “da performance permanente” os sujeitos fazem acontecer ou pelo menos lançam mão de todos os instrumentos de que dispõe para não ficar de fora, corroborando a promoção da indistinção entre ser e perecer.
Sociólogos, Economistas, historiadores, que trabalham com o tema do “mundo contemporâneo”, enfatizam que dos sujeitos exige-se que sejam ágeis, disponíveis à rápidas mudanças, que assumam riscos continuamente. “Entregues a própria sorte sua autonomia configura-se como uma ilusão de liberdade”
Lembrando o Filósofo Valter Benjamim, é assim que mergulhados neste bojo de processos psicológicos de “normalização” em abandono aos processos que tem como base entre o mesmo ( o eu) e o outro (com quem me relaciono), “sitiados” entre o desejo de normalização e a possibilidade de existência e de resistência em face a renúncia de qualquer plano ou esperança utópicos, constata-se que a fragmentação do sujeito, da subjetividade tem seu lugar em uma nova configuração social constituída no ocidente. O chamado autocentramento, Bartucci (2006), conjugando-se assim ao valor da exterioridade – os destinos do desejo assumindo uma direção autocentrada e exibicionista resultado daí em um deslizamento generalizado do “ser” para o “parecer”. Morte ao Vivo. A falência da subjetividade. Os abusos das drogas sejam elas compradas em “Bocas” ou em “Farmácias”. Em pílulas ou livros de auto-ajuda.E mais alguns ditames que perambulam erroneamente e pergunto: Meu filho vai ser aquilo que eu compro?

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Sobre a Agressividade.




Sobre Agressividade.

Para reportar estes conceitos, buscarei elementos importantes no trabalho do Psicanalista Inglês Donald Winnicott. Tema este que sempre interessou o Médico e pediatra e que hoje inunda a mídia.
É Verdade há muito na literatura psicanalítica vinculando a agressão (em especial aquela relativa à frustração, a raiva) com o principio daquilo que chamamos de “principio da realidade”. No Entanto Winnicott utilizou a teoria psicanalítica de um modo muito característico, não olhando para a “destrutividade” como um “instinto de morte” como está colocado na obra Freudiana. Acredita-se então que a agressão pode ser vinculada à motilidade pré-natal do bebê, aos impulsos do feto, àquilo que contribui para o movimento do feto ao invés da quietude. Para tanto necessitamos de um termo com força vital. Novamente a agressividade, como nas suas origens é quase sinônimo de movimento, uma questão de função parcial.
Sobre isso Winnicott descreve: “um bebê dá pontapés dentro do útero; não se pode supor que ele esteja querendo sair. Um bebê de algumas semanas abana os abraços; não se pode dizer que ele tem a intenção de bater. Um bebê morde os mamilos com a gengiva, não se pode dizer que ele tem a intenção de destruí-lo ou machucá-lo; Na sua origem a agressividade é quase sinônimo de atividade, é uma questão de função parcial, são estas funções parciais que a criança a medida que se torna uma pessoa, gradualmente se organiza, dando origem a agressão. Um paciente quando doente pode exibir atividade e agressividade sem uma intenção precisa. Entretanto, toda vez que o comportamento tem um propósito, há intenção de agressão” A agressão faz parte da expressão primitiva do amor
Assim, do mesmo modo como valorizou a tendência natural ao movimento dos seres vivos como a raiz básica da agressividade, podemos postular também que a oposição ao movimento natural de uma criança por parte do ambiente tende a acentuar a resposta agressiva por parte do bebê. Ele falou mesmo da graduação, desde uma oposição tão ferrenha que não dá oportunidade à criança de ter possibilidade de existir, até uma oposição adequada, que dá ao ser a possibilidade de recebê-la como um limite adequado e mesmo protetor. Numa condição intermediária o ser passa a existir apenas através de reações à oposição que lhe está sendo feita.
Em ‘Agressão e suas raízes’ (1964, Privação e Delinqüência), Winnicott escreveu sobre a importância da fantasia:
“O que sabemos sobre a origem dessa força inerente aos seres humanos e subjacentes à destrutiva ou seu equivalente no sofrimento sob autocontrole? Por trás dela está a destruição mágica. Isso é normal para a criança nas primeiras fases do seu desenvolvimento e caminha lado a lado com a criança mágica. A destruição primitiva e mágica de todos os objetos está ligada ao fato de que (para a criança) o objeto deixa de ser parte de ‘eu’ para ser ‘não eu’, deixa de ser fenômeno subjetivo para ser percebido objetivamente. Geralmente esta mudança ocorre por gradações sutis, mas havendo uma participação deficiente da mãe estas mesmas mudanças ocorrem bruscamente e de uma maneira imprevisível para a criança... Ao acompanhar a criança com sensibilidade, através desta fase vital do início do desenvolvimento, a mãe estará dando tempo ao filho para adquirir todas as formas de lidar com o choque de reconhecer a existência de um mundo situado fora do seu controle mágico. Dando-se tempo para os processos de maturação, a criança se tornará capaz de ser destrutiva e de odiar, agredir e gritar, em vez de aniquilar magicamente o mundo”. (Winnicott, 1964).
Em “Agressão e sua Relação com o Desenvolvimento Emocional” (1950), ele já havia descrito três estágios no desenvolvimento da agressividade. No estágio inicial, que chamou de:
Pré-preocupação: “Pode-se dizer que a criança existe como pessoa e têm objetivos, apesar de não se preocupar com os resultados. Ela ainda não consegue reconhecer que o objeto destruído por sua excitação é o mesmo que ela valoriza nos intervalos tranqüilos, entre as excitações”(...) Na etapa seguinte, de Preocupação, “a integração do ego do indivíduo é suficiente para que ele avalie a personalidade da figura materna e isto tem um resultado extremamente importante: o indivíduo se preocupa com os resultados de sua experiência pulsional básica e ideacional”. Nesta etapa, surge a capacidade de sentir culpa e os desejos de reconstruir e reparar. No terceiro estágio, o da Personalidade Total, há a capacidade de desenvolver múltiplas relações interpessoais, a partir dos conflitos triangulares. Nesse estágio, o amor e a agressividade se apresentam fundidos. Enquanto Winnicott enfatizou mais a preocupação , M. Klein pôs maior na culpa, em relação à posição depressiva.
Winnicott, como Freud e outros psicanalistas, deu importância à fusão do amor e do ódio como forma da agressividade ficar controlada (e subordinada) ao amor. Ele também escreveu a propósito do sadismo que o indivíduo só se sente real quando é destrutivo e cruel. (1)
Ele acrescentou que uma boa parte da confusão existente neste terreno é devido ao fato de que freqüentemente usamos o termo agressão quando queremos dizer espontaneidade. “O gesto impulsivo se estende para fora e se torna agressivo, quando é atingida a oposição. Minha sugestão é a seguinte: é esta impulsividade, e a agressão que se desenvolve a partir dela, que faz com que o bebê necessite de um objeto externo, e não apenas de um objeto que o satisfaça”
Júlio de Mello Filho chamou a atenção para a similitude destas visões de Winnicott com as concepções de Freud sobre a agressividade contida em sua primeira tópica e, portanto, antes de sua visão final da oposição entre pulsão de vida e pulsão de morte.(2)
Com efeito, Freud escreveu em Três ensaios sobre a Sexualidade que;
“A crueldade em geral aparece facilmente na natureza infantil, já que o obstáculo que detém o instinto de domínio diante da dor de outra pessoa, ou seja, a capacidade para a piedade, se desenvolver regularmente tarde (...). Pode-se presumir que o impulso da crueldade surge do instinto de domínio e aparece num período de vida sexual em que os órgãos genitais ainda não assumiram ser papel ulterior”. Nesta mesma linha de pensamentos Freud escreveu neste mesmo trabalho sobre “Atividade muscular” que. “Estamos todos familiarizados com o fato de que as crianças sentem a necessidade de grande dose de exercício muscular ativo e tiram extraordinário prazer da satisfação desta necessidade (...). Uma das raízes do instinto sádico pareceria residir na incentivação da excitação sexual pela atividade muscular.” Em “Os Instintos e suas Vicissitudes” ele também escreveu que. “O ódio, enquanto relação com objeto é mais antigo que o amor. Provém do repúdio primordial do ego narcisista ao mundo externo com seu extravasamento de estímulos. (3) A história das origens do amor nos permite compreender por que é que o amor com tanta freqüência se manifesta como ambivalente – isto é, acompanhado de impulso de ódio contra o mesmo objeto”. (4)

sexta-feira, 6 de março de 2009

Medicando o Espírito

As linhas que vêm a seguir, não têm o objetivo de fazer um ataque ao trabalho dos psiquiatras que são os profissionais unicamente e tecnicamente capacitados para trabalhar e receitar medicações chamadas de psicofármacos. Muito antes disso, denunciar as práticas abusivas de generalistas que de posse do receituário “azul” praticam de forma indiscriminada e abusiva o uso de medicações controladas para um suposto beneficio de seus pacientes, na melhor das hipóteses. A pior seria para uso próprio. Aquilo que chamamos de MEDICALIZAÇÃO (ver em outro texto meu www.fabioulrich.com)

MEDICANDO O ESPÍRITO.

Foi a partir de 1950 que os psicotrópicos transfiguraram a paisagem da “loucura”. Como já citamos em momentos anteriores, esvaziaram os manicômios, aposentaram a camisa de força e os tratamentos de choque (embora caiba lembrar que esta prática ainda é utilizada no Rio Grande do Sul), o chamado ECT, Eletro choque terapia. Embora não curem nenhuma doença mental, fabricaram um outro tipo de sujeito. Sujeito este muitas vezes polido, sem humor, sem paixões, um “normopata”, quando não um dependente químico das chamadas drogas lícitas.

Deste eixo bifurcamos vários e desastrosos caminhos: Como afirma Roudinesco (2002) “(...) receitados tanto por clínicos gerais quanto por especialistas em psicopatologia, os psicotrópicos tem o efeito de normalizar comportamentos e eliminar os sintomas mais dolorosos do sofrimento psíquico, sem lhes buscar a significação (...)”

Os Psicotrópicos são Classificados em três grupos:

- Os Psicolépticos;

- Os Psicoanalépticos e os Psicodislépticos;

No primeiro grupos estão os medicamentos hipnóticos, que tratam de distúrbios do sono, assim como os ansiolíticos e os tranqüilizantes, que eliminam sinais de angústia, ansiedade, algumas fobias (momentaneamente). Ainda temos os neurolépticos (ou antipsicóticos), medicamentos estes específicos para a psicose e todas suas formas de delírios crônicos ou agudos. No segundo grupo “reúnem-se” os antidepressivos , os estimulantes, e no terceiro os medicamentos alucinógenos e os reguladores de humor.

No entanto , à força de acreditar no poder de suas poções, a psicofarmacologia acabou por perder seu prestígio, ou parte dele. Ela encerrou os sujeitos em outra alienação tentando curá-los de suas própria essência humana, de sua condição humana.Sendo assim através de suas ilusões engendrou um novo irracionalismo. Inaugura-se então um novo paradoxo: aquilo que era o remédio agora é o veneno, como diria Renato Russo em uma de suas canções: “Minha papoula da índia, minha flor da Tailândia, és o que tenho de suave, e me fazes tão mal”

Não é surpresa alguma hoje que os excessos da psicofarmacologia estão sendo denunciados justamente por aqueles que o haviam enaltecido. Hoje suas proposições reivindicam que os chamados remédios da mente sejam usados de maneira mais racional e responsável e coordenação com outras formas de tratamento: a psicanálise a psicoterapia. Jonh Delay principal representante francês da psiquiatria biológica afirmou em 1956 “Convém lembrar que, em psiquiatria, os medicamentos nunca são mais que um momento do tratamento de uma doença mental e que o tratamento básico continua sendo a psicoterapia”

Estudos do FDA apontam que em 2007, oitenta por cento dos suicidas americanos usavam somente antidepressivos. Está dito. Mais dados estatísticos também de 2007 mai dados são apresentados pela Universidade Federal de Brasília e cooperação com o Ministério da saúde: suas pesquisas apontam que 60% dos dependentes de ansiolíticos são profissionais da área da saúde, principalmente médicos e enfermeiros com trabalhos concentrados em hospitais.

Com isso ressaltamos que o medicamento em si não se opõe ao tratamento pela fala. A psicanálise, afirma Roudinesco (2000) afirma que por toda parte a psicanálise reina soberana, mas também em toda parte, por equívocos é colocada em concorrência com a psicofarmacologia. A França e o Brasil são hoje os países que mais consomem antidepressivos. Se a psicanálise hoje é posta em concorrência com a psicofarmacologia, é também porque os próprios pacientes, submetidos à barbárie da biopolítica, passaram a exigir que seus sintomas tenham uma causalidade orgânica. Em conseqüência disso, entre os psicotrópicos os antidepressivos são os mais receitados sem que possamos afirmara que os estados depressivos tenham aumentado. O problema é somente hoje a medicina alimenta e responde ao paradigma da depressão. Como se qualquer alteração de humor, por paciente relatada ao ginecologista fosse uma depressão. Qualquer estado de tristeza, não é necessáriamente depressão. Lembramos o ser humano só é feliz se souber ficar triste. Esta é sua condição. Se o limiar de tolerância diminuiu ou baixou e seu desejo de liberdade se extinguiu o mesmo parece que acontece com os médicos que receitam ansiolíticos e antidepressivos indiscriminadamente. Pesquisas do Jornal Le Monde “le médicines em état d’urgence. Boire toute l’angoise dês patiets” mostraM que inúmeros clínicos franceses, sobretudo os que cuidam de emergência, não estão em melhores condições que seus pacientes. Imaginem uma pesquisa como esta no Brasil.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

A morte ao vivo




Enfermaria, segundo o dicionário Aurélio, é substantivo feminino originado da junção dos termos “enfermo” e “ária”, que designa edificação destinada ao tratamento de enfermos, dependência hospitalar em que se internam doentes, ou não hospitalar - como colégio ou fábrica – para atendimento médico de urgência ou transitório; casa onde se recolhem animais para serem tratados. Começamos assim para vislumbrar por onde esta coluna pode ir ou quem ela pode receber.


Nesta primeira “triagem”, falemos um pouco do ser humano contemporâneo. Não, não é uma tarefa fácil. Mas o objetivo aqui não é encerrar questões ou trazer explicações óbvias, que muitas vezes são equivocadas e servem mais para o narcisismo de quem escreve. Muito bem. Más notícias: Dom Quixote me disse: nossos filhos estão se matando. Bem, se isso não trouxesse alguma audiência para a mídia o nosso “Lafayete” o “Lindenbergue” passaria anônimo. A diferença entre este e os outros crimes dos adolescentes: durou cinco dias, deu Ibope.
A nossa adolescência atravessa uma de suas piores crises: drogas, violência, morte, desencontros familiares, falta de perspectiva: Dom Quixotes. “Mato, logo existo”. A falência da figura paterna se petrifica e petrifica os adolescentes. Semana que vem quem será o refém? Só saberemos se for algo da ordem do espetáculo. Enquanto isso, quantos adolescentes morreram pelo uso do crack? Quantos mataram outros tantos?
E temos os pré-adolescentes: notícias boas? Não creio. Alguém diz por aí que se os pais não cuidam a Ritalina dá um jeito! Ou parece dar. Se as crianças estão melhorando, não sei, mas os “cuidadores” adeptos desta prática “normatizadora” parecem ter mais tempo para suas drogas lícitas.
O objetivo aqui, nestas poucas linhas, não é trazer a tona somente as esquinas obtusas que alçam nossas pernas, mas, num primeiro momento, chamar a atenção. Esperamos demarcar um espaço para discussão, questionamentos e quantos desdobramentos vierem a ser possíveis para que possamos tratar com um pouco mais de atenção do incêndio que começa a nossas costas. Talvez chamar a atenção para a intimidade emocional que perdemos com nossos filhos. Um tênis de alguns euros não irá resolver muito.
Um pouco das escolas: vivemos num modelo de educação falido. Por um lado, nas escolas particulares, os professores se esforçam para atender seus “clientes”, enquanto que, na escola pública, os professores tratam de fugir das balas perdidas. Ou nem tão perdidas assim. Evidente que existem modelos que merecem nossa atenção como aquele que vêm se desenvolvendo nas escolas nas cidades de Salvador e Esteio. Mas, num panorama geral, nos aventuramos surdos por uma crise sem precedentes. O Estado se mostra débil diante de tudo, mas há quem diga que “na história deste país nunca se deu tanta bolsa família. Nostalgia não. Mas Getúlio Vargas está vivo.